A Voz do Local - Quando a temática da
democracia participativa se cruza com o desenvolvimento local - a opinião de Gonçalo Folgado (CR)
Com 41 anos de
democracia em Portugal temos vindo a assistir, gradualmente, desde o final da
década de 80, inícios de 90, a uma crise de participação pública que se tem
revelado em altas taxas de abstenção nos vários momentos em que os portugueses
são chamados a decidir e a participar na construção da chamada democracia
participativa.
Não sei bem, se este fenómeno se assemelha, mais, a uma
crise de adolescência como aquela que passa o meu, rebelde, primo ou a uma de
meia-idade como a que o meu avô passou, em que a descrença se assumia como o
mote mas, esta é claramente uma crise.
Desenvolvimento
social a partir das bases
A participação pública não deve ser encarada como
formalidade de processo, tem de ser tida como um exercício de aprofundamento
mas, sobretudo, de sobrevivência deste sistema politico e como tal, deverá ser
valorizada como uma dimensão essencial de um processo de desenvolvimento
social.
Acredito que, este desenvolvimento social, só é feito a
partir das bases, ou seja, das pessoas e com as pessoas, na rua, no espaço
público, em suma, em espaços que são de todos.
Estamos assim, todos sem excepção, convocados a participar
no processo de melhoria das nossas ruas, dos nossos bairros, das nossas
aldeias, vilas e cidades, resumindo do País.
Vale aqui a velha máxima do “Pensar global, Agir Local”,
pois, é justamente através de processos de organização comunitária que tenham
em vista o Desenvolvimento Local, que se reforça o exercício da Democracia
Participativa, premissa consagrada na Constituição Portuguesa:
“Artigo 9º (tarefas
fundamentais do estado)
c) defender a
democracia politica, assegurar e incentivar a participação democrática dos
cidadãos na resolução dos problemas nacionais”
Auto-organização das
comunidades
Este exercício da inclusão das comunidades na resolução de
problemas comuns é, já, uma prática comum em várias democracias, bem mais amadurecidas
que a portuguesa, e é um processo que, por si só, acarreta uma chamada de
atenção, tendo como objectivo a capacitação das comunidades ao nível da sua
auto-organização, reflexo da sua capacidade de resposta.
A participação das comunidades neste processo, é a base de
tudo o resto, pois, a abordagem é baseada na igualdade entre todos os cidadãos,
independentemente de género, faixa etária, raça/etnia, classe… o que realmente
importa, é o esforço que cada um de nós despende em mudar a sua comunidade.
A magia da
participação pública
Mas, afinal de contas o que é um processo de Desenvolvimento
Local? Na minha óptica é um processo de construção de laços comunitários,
mediante a melhoria do processo em si, ou seja, em bom português o que importa,
independentemente do resultado final, (seja a construção de um equipamento, a
feitura de um espaço verde, um curso de primeiros-socorros para guardiões-de
rua, uma acção de sensibilização, etc…) é o processo pelo qual lá chegamos. E é
aí que acontece a magia, por assim dizer, pois estes processos têm um poderoso
fio condutor, a Participação Pública, a inclusão da comunidade, não como
destinatária final, mas como parte da solução!
Estes são processos que podem quebrar barreiras de dentro da
comunidade para fora dela, pois, promovem a comunicação entre pessoas de
backgrounds completamente diferentes, que estão juntas com um propósito, por um
objectivo comum.
Um processo de desenvolvimento local promove encontros entre
pessoas da mesma comunidade que, à partida, não se encontrariam e só isso já
significa uma vitória, mas há mais, senão reparem;
Aprender nos
processos de desenvolvimento local
O processo de Desenvolvimento Local pode ser, também, rico
em várias aprendizagens e ajudar as pessoas que o compõem a adquirir novas
capacidades e conhecimentos em áreas distintas e complementares entre si, tais
como:
-liderança e
administração
-capacidades
de facilitação
-aprofundamento
de capacidades de análise e proposta
-uma visão
geral de como actuam os sistemas para intervir na vida das comunidades
-compreensão
da Economia e Urbanismo em micro e macro-escalas
entre tantas
outras…
São processos que por si só, podem e devem despoletar
Lideranças Locais entre a comunidade, essenciais na optimização da capacidade
de reacção e de resposta do grupo aos problemas e, consequentemente, na
mobilização de recursos, humanos ou/e materiais.
Auscultar todas as
opiniões
Este tipo de processos de Desenvolvimento Local devem
outorgar os membros de uma comunidade e fazer com que a Democracia
Participativa, seja o método habitual para as tomadas de decisão da comunidade,
pela construção de infra-estruturas inclusivas e participativas que assegure
que, todas, as opiniões são auscultadas.
São portanto, processos morosos e que exigem tempo de
maturação, contudo, são eficazes na medida em que reforçam as decisões tomadas
e invocam o epiteto da corresponsabilização e consequentemente a cogovernação,
expressão mais pura da Democracia Participativa.
Assim os primos rebeldes e os avôs descrentes desta vida,
consigam ultrapassar as crises e fazer valer uma bela frase de Oscar Wilde em
The Soul of Man under Socialism de 1891 : “A map of the world that does not
include utopia is not even worth even glancing at”,para que juntos possamos
construir as nossas utopias, e juntos construamos o nosso
mundo!
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